Doutorado sanduíche

Existem diferentes modalidades de bolsas para o exterior oferecidas, como professor visitante, estágio sênior, pós-doutorado, doutorado/mestrado/graduação pleno e sanduíche. Basicamente, o doutorado sanduíche é um programa de estudos no qual o estudante de pós realiza parte de seu trabalho em uma universidade no exterior. Como normalmente esse intercâmbio, que geralmente dura um ou dois semestres, acontece no meio do programa de doutorado, ele acaba sendo o “miolo” da pesquisa. Daí o nome “doutorado sanduíche”: os anos de pesquisa na instituição de ensino brasileira são as ”fatias de pão”, e o intercâmbio é o “recheio”.

Arte sobre doutorado sanduíche. Adaptado de MEC
Arte sobre doutorado sanduíche. Adaptado de MEC

Dentre as instituições que oferecem esse tipo de bolsa está a CAPES. E dentre as formas de se obter essa bolsa está o programa CAPES-PrInt, presente em algumas instituições de ensino superior (IES) do Brasil. Assim, apesar desse post contemplar uma experiência específica, ele pode ilustrar um pouco do processo e ajudar outros estudantes em alguns pontos.

Algumas universidades possuem um departamento de relações internacionais que podem direcionar o aluno a universidades pelo mundo com as quais ela já tem parcerias de intercâmbio – ou mesmo firmar uma nova parceria. No exterior, também existem instituições que financiam bolsas, inclusive desse formato. No Brasil, um dos órgãos que oferecem bolsas é o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), através do programa SWE. Outro dos órgãos é a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), através do Programa de Doutorado-sanduíche no Exterior (PDSE) ou do Programa Institucional de Internacionalização (CAPES-PrInt).

O PDSE oferece diretamente bolsas individuais com o objetivo de apoiar a formação de recursos humanos de alto nível, prioritariamente em áreas do conhecimento menos consolidadas no Brasil. Já o PrInt é um projeto ligado aos Programas de Pós Graduação das instituições, com duração de até 4 anos. Dentre os objetivos do PrInt, está o de fomentar a construção, a implementação e a consolidação de planos estratégicos de internacionalização das instituições contempladas nas áreas do conhecimento por elas priorizadas.

Processo seletivo

No caso do PrInt, o processo seletivo ocorre coordenado pelo programa de pós graduação (PPG) da própria instituição, encaminhando os nomes à CAPES. Existem diversos editais emitidos por diferentes IES. Assim, como exemplo, seguirei as orientações dadas pelo edital 001/2023 do INPE para bolsas de Doutorado Sanduíche. Dentre os requisitos para se inscrever, estão:

  • ser brasileiro ou estrangeiro com visto permanente no Brasil;
  • estar matriculado como aluno regular em um dos PPG da IES;
  • comprovar qualificação para usufruir, no exterior, da oportunidade de aprofundamento teórico, coleta e tratamento de dados, ou desenvolvimento parcial da parte experimental da tese a ser defendida no Brasil;
  • possuir o nível de proficiência na língua estrangeira – veja mais no link, com foco no inglês/TOEFL;
  • apresentar manifestação de interesse ou convite do orientador do exterior para execução do plano de trabalho do estágio no exterior;
  • já ter concluído créditos suficientes em disciplinas, bem como exame de qualificação e proposta de tese (condições variam conforme a IES);
  • programar o retorno do exterior, no mínimo, 6 (seis) meses antes do prazo máximo para defesa do doutorado ou ao completar o prazo máximo regulamentar de financiamento de agência pública de fomento;
  • não ter sido contemplado com bolsa de doutorado sanduíche no exterior no atual ou em outro curso de Doutorado realizado anteriormente.

Para comprovar essas condições, o candidato deve entregar os documentos especificados no edital, como formulário preenchido, cópias de documentos, links de currículos e cartas do orientador e do supervisor no exterior. O(A) coorientador(a) no exterior deve ser doutor com produção acadêmica consolidada e relevante para o desenvolvimento da tese do(a) doutorando(a), também pertencendo a uma instituição de ensino ou de pesquisa de relevância para o estudo pretendido. Caso o país de destino tenha o português como idioma oficial, costuma-se exigir a comprovação de proficiência em inglês.

O bolsista também deve se comprometer a estar quite com as obrigações militares (caso for do sexo masculino), obrigações eleitorais, não estar impedido por força de decisão judicial ou administrativa de receber benefícios, não possuir restrições junto à Dívida Ativa da União ou CADIN, demonstrar desempenho acadêmico satisfatório, dedicar-se integralmente ao desenvolvimento das atividades no exterior, dentre vários outros itens.

Após cumprimento de todos os requisitos do processo seletivo, o coordenador do PrInt na instituição de ensino envia o processo à CAPES no SCBA (Sistema de Controle de Bolsas e Auxílios). Se estiver tudo certo, a CAPES começa a fazer o envio de mensagens através da Linha Direta (com aviso em seu e-mail informado no SCBA) com algumas instruções, como aceite dos termos da bolsa e completar outras informações.

Não é esse Linha Direta :P é o sistema de comunicação entre os beneficiários de bolsas e auxílios da CAPES
Não é esse Linha Direta 😛 é o sistema de comunicação entre os beneficiários de bolsas e auxílios da CAPES

Implementação

Após alguns dias, a CAPES deve fazer o envio da Carta de Concessão da bolsa (importante para obter o visto do país de destino) e do Termo de Outorga ao candidato aprovado. Nesse post vão algumas orientações gerais, baseadas na portaria nº 289, de 28 de dezembro de 2018 que rege o edital aqui considerado (valores foram definidos conforme portaria nº 1, de 3 de Janeiro de 2020). Os documentos solicitados inicialmente são:

  • Termo de Outorga – assinar, rubricar todas as outras folhas e enviar de volta pelo Linha Direta;
  • Declaração de suspensão de bolsa no país – solicitar emissão ao PPG, informando nome completo, nº de registro na IES, CPF, número do processo a ser suspenso e código PPG (disponível através de busca na Plataforma Sucupira), pois não é permitido o acúmulo de bolsas;
  • Procuração instituindo procurador para tratar de assuntos caso a CAPES não consiga contactar o bolsista;
  • Visto – veja mais informações no post Visto para estada temporária em Portugal (EM BREVE).

Sobre a suspensão de bolsa, a declaração não implica em suspender realmente a bolsa. No mês de início do período de sanduíche (após receber o pagamento mensal da bolsa referente ao mês anterior), deve-se pedir para coordenador do curso suspender a bolsa atual no final do mês. Uns 15 dias antes de voltar ao país, pedir para o coordenador ativar novamente a bolsa.

Também podem enviar uma mensagem pedindo um seguro-saúde – o que geralmente já é exigido para obter o visto. O documento solicitado é um comprovante de aquisição e a cópia da apólice do seguro-saúde no qual conste o(a) bolsista como titular do plano, especificando o nome do(a) segurado(a), a vigência do seguro, coberturas previstas e valor pago. Na apólice, destacar de amarelo o período de cobertura, a cobertura referente repatriação funeraria e familiar, e incluir, no mesmo arquivo, o recibo de comprovante de pagamento do seguro-saúde. No entanto, esse arquivo deve ser enviado em até 30 dias contados da chegada ao país de destino – pode até ser enviado antes mas só entra no sistema depois, via SCBA. Veja mais sobre seguro-saúde (ou seria seguro-viagem?) clicando no link.

Benefícios

Dos benefícios, existem a mensalidade, auxílio deslocamento, auxílio instalação e auxílio seguro-saúde. Também podem ocorrer o auxílio localidade (se for alguma das cidades listadas na Portaria Capes no 202, de 16 de outubro de 2017). Quando previsto em instrumento de seleção, pode ser incluído o adicional dependente, com incremento nos valores também de seguro-saúde e passagens. De modo geral, não existe auxílio dependente para a modalidade de Doutorado Sanduíche. Nessa modalidade, importante destacar também que a instituição receptora deve isentar o doutorando da cobrança de taxas acadêmicas, administrativas e de bancada, já que a CAPES não se responsabiliza por essas despesas.

Apesar de no edital constar “Art. 20. O(a) bolsista receberá passagens em classe econômica e tarifa promocional, para seu deslocamento de ida e volta, entre o país de origem e o local mais próximo ao local de realização de atividades”, a interpretação da CAPES (em comunicação via Linha Direta) é que o auxílio deslocamento é pago para que o bolsista compre suas passagens. Bolsas até 10 meses recebem em parcela única o auxílio deslocamento, enquanto que as acima de 11 parcelas recebem na primeira e na última remessas de pagamento).

É definida uma mensalidade destinada a contribuir com as despesas de manutenção do bolsista no país de destino. A Capes paga, preferencialmente, no Brasil a primeira remessa de mensalidades ao(à) bolsista que resida no Brasil no momento da concessão da bolsa, o que pode ser de um a três meses antes da data de viagem se entregar a documentação em dia. Aparentemente, a primeira remessa corresponde à parcela 1 (de 2) do auxílio deslocamento, auxílio instalação, todas as parcelas de auxílio seguro saúde e às duas primeiras parcelas da mensalidade (considerando um total por volta de 12 parcelas). A segunda remessa de mensalidades é paga no exterior – apesar de não constar na portaria, aparentemente a Capes adota a segunda metade do último mês de trimestres fixos para o pagamento: fevereiro-abril; maio-julho; agosto-outubro; novembro-janeiro. Chegando depois do dia 15 ou voltando antes desse dia do mês, a respectiva mensalidade é cortada em 50%.

O prazo de transferência de recursos é de até 30 dias antes do início da vigência da bolsa, caso haja, no mínimo, 60 dias entre o envio do Termo de Compromisso devidamente datado/assinado/digitalizado e da Aceitação Eletrônica de Bolsa no Exterior. No caso dos depósitos realizados em conta corrente no Brasil, o valor é creditado em moeda corrente brasileira, adotando-se a cotação de câmbio para compra divulgada pelo Banco Central referente ao dia imediatamente anterior ao da autorização do pagamento. Se a duração da bolsa for superior a 6 meses, o pagamento dos auxílios no exterior é feito por meio do cartão bolsista (é aberta automaticamente uma conta no BB Américas, que pertence ao Banco do Brasil).

Obrigações

A prestação de contas de chegada no exterior deve ser efetuada no prazo máximo de 30 dias após a chegada. Essa prestação consiste do envio dos seguintes documentos de comprovação de chegada (no SCBA, campo Documentos):

  • Bilhete eletrônico de partida – documento que confirma a reserva e a compra do voo (contém informações como o nome do passageiro, número do voo, data, horário e destino);
  • Cartão de embarque de partida – documento utilizado para efetivamente embarcar no avião (geralmente emitido depois do check-in, contém informações semelhantes ao bilhete eletrônico, incluindo informações sobre o assento e portão de embarque);
  • Comprovante do Seguro Saúde – com os destaques mencionados anteriormente;
  • Páginas do passaporte em que conste a foto e a data de sua chegada ao exterior – página de identificação e página com carimbo de chegada ao país de destino, com data (ou documento emitido pelo órgão de imigração do país de destino).

Caso tenha auxilio dependente, o mesmo deve ser feito para cada um deles. Também deve-se enviar o comprovante da contratação do seguro-saúde (conforme explicado anteriormente). Além disso, podem pedir um comprovante de matrícula ou carta da instituição atestando o início das atividades.

Para participar de eventos acadêmicos, o(a) bolsista deverá, com antecedência mínima de dez dias, submeter o seu pleito para a apreciação da Capes, mediante o envio dos seguintes documentos: prospecto do evento, com local e data; convite ou comprovante de inscrição no evento; autorização do(a) orientador(a) no Brasil e no exterior, justificando a relevância da participação no referido evento; e solicitação formal, constando o período total de afastamento do local de estudos, que não poderá exceder dez dias corridos por evento. Após o retorno, o(a) bolsista deve enviar à Capes comprovação de retorno ao local de estudos e da participação no evento.

Além de dedicar-se integralmente ao desenvolvimento das atividades no exterior, deve-se permanecer no país de destino durante o período integral da concessão e requerer permissão da CAPES, com antecedência mínima de 30 dias, para viagem relacionada ou não ao plano de estudos ou projeto de pesquisa, sem prejuízo ao prazo estabelecido para a conclusão dos trabalhos.

A prestação de contas de retorno ao Brasil deve ser efetuada no prazo máximo de até 60 dias após o término da concessão ou das atividades acadêmicas, o que ocorrer primeiro. Ela ocorre pelo envio dos seguintes documentos (além dos previstos nos instrumentos de seleção específicos): comprovante de retorno (cartão de embarque ou declaração emitida pela empresa aérea e bilhete eletrônico); relatório final de atividades (disponível no sistema eletrônico) com um parecer de desempenho do aluno; atualização dos contatos no Brasil; e certidão de movimentos migratórios.

Adicionalmente aos documentos indicados, para a modalidade Doutorado Sanduíche, devem ser apresentados: parecer do(a) orientador(a) brasileiro(a); parecer do(a) coorientador(a) estrangeiro(a); declaração da coordenação do curso ou de representante da instituição de origem informando sobre o retorno do(a) bolsista às atividades no Brasil; e comprovante de defesa da tese (documento oficial certificando a conclusão do curso) em até trinta dias após a conclusão.

O(A) ex-bolsista recebe Carta de Regularização após a prestação de contas do período no exterior e o processo segue para acompanhar o cumprimento do interstício. De modo geral, o período de interstício nas modalidades sanduíche começa a partir da data de chegada ao Brasil e termina a conclusão dos estudos no Brasil que ensejaram a concessão da referida bolsa no exterior, permanecendo no Brasil. O prazo máximo para integralização do período de interstício é de sessenta meses.

A prestação de contas referente ao período de interstício no Brasil ocorre pelo envio obrigatório em até sessenta dias do término do período, por meio do sistema eletrônico da Capes, dos seguintes documentos: Currículo Lattes e Open Researcher and Contributor ID (ORCiD) atualizados, contendo atividades desenvolvidas após retorno ao Brasil e citando a Capes como instituição de fomento da bolsa no exterior; certidão de movimentos migratórios emitida pela Polícia Federal; relatórios de atividades.

O bolsista deve fazer referência ao apoio recebido pela Capes em todas as publicações que resultarem dos estudos realizados no período da bolsa recebida. Deverão ser usadas as seguintes expressões, no idioma do trabalho: “O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.” ou “This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Finance Code 001.”

Finda a prestação de contas do período de interstício e com o atendimento a eventuais cobranças financeiras ou documentais, o(a) ex-bolsista recebe uma Carta de Encerramento do Processo.

E falando em prestar contas, não esquecer também da Declaração de Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF). Se os valores forem pagos depal CAPES, basta acessar o link para informes de rendimento e buscar pelo ano e CPF. Mesmo os valores em euros são apresentados em reais. O valor recebido a título de bolsa de estudos deve ser informado na ficha “Rendimentos Isentos e Não Tributáveis”. Selecione o código “01” se o bolsista não é médico-residente e não participa do Pronatec.

Experiência

Os objetivos da concessão de bolsas para o exterior exibidos na portaria ilustram as oportunidades de crescimento profissional: complementar e expandir o conhecimento em áreas de fronteira da ciência, incluindo áreas estratégicas, com tipos de abordagem não consolidados no Brasil; atualização de conhecimentos técnicos, científicos, tecnológicos e acadêmicos; ampliar o nível de colaboração e de publicações conjuntas entre a comunidade acadêmica que atua no Brasil e no exterior, com aumento da visibilidade profissional e acesso a instituições internacionais de excelência.

Ao longo de sua carreira acadêmica, é comum ler artigos e assistir apresentações de pesquisadores do mundo todo sobre temas ligados a suas pesquisas. Assim, deve haver uma sinergia maior do que alguns deles pesquisam e os seus objetivos de trabalho. Entrando em contato com esses pesquisadores é uma forma de começar a definir uma possível parceria para realizar um doutorado sanduíche.

Passar um tempo em outro país vai deixar o seu currículo mais interessante e atrativo, abrindo novas possibilidades de emprego e renda, seja no Brasil ou em um outro país. Ganha-se muita experiência de vida morando um certo tempo fora do país, o que promove um crescimento pessoal. São conhecidos outros costumes e vivenciada uma nova cultura, mudando a forma como você vê o mundo. Além disso, pode-se conhecer outros lugares que eram distantes e caros mas agora estão mais próximos e acessíveis.

Aprender um novo idioma é sempre citado nas vantagens de e morar fora do país de origem. Mesmo brasileiros morando em Portugal vão aprender algumas palavras do Português lusitano. Viver fora do Brasil obriga a começar tudo do zero – desde burocracias e novos documentos até encontrar um lugar para morar e fazer novos amigos. Também é preciso se acostumar com a vida em uma nova cidade e o clima local. Passar por essas etapas ajudam a forjar uma maior resiliência a novos problemas de todo tipo.

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