Atmosferas de exoplanetas cada vez mais detalhadas

O Telescópio Espacial James Webb, lançado em 2021, vem trazendo grandes avanços na observação de planetas fora do nosso sistema solar, conhecidos como exoplanetas. As descobertas da composição da atmosfera desses planetas, que estão a centenas de anos-luz de distância da Terra, e cada vez mais detalhadas permitem estimar possíveis lugares onde haja vida extraterrestre. Entenda um pouco de como esse telescópio consegue fazer esse tipo de observação e quais planetas já tiveram atmosferas estudadas – veja atmosferas estudadas previamente no post Nuvens de metal e chuvas de pedras preciosas.

Ilustração mostra como poderia ser o exoplaneta WASP-39b, com base na compreensão atual do planeta. Fonte: NASA
Ilustração mostra como poderia ser o exoplaneta WASP-39b, com base na compreensão atual do planeta. Fonte: NASA

Telescópio e astronomia infravermelha

Desenvolvido em conjunto pelas agências espaciais dos EUA (NASA), Europa (ESA) e Canadá (CSA), o telescópio James Webb tem o objetivo de ser um observatório fora da Terra com foco para captar radiação infravermelha. Sua massa equivale a aproximadamente metade do Hubble, porém seu espelho primário possui um diâmetro 2,5 vezes maior e uma área de espelho seis vezes maior que a do Hubble, permitindo captar muito mais luz. Ele também opera bem mais distante da Terra, orbitando no halo que constitui o segundo ponto de Lagrange L2.

Como o vapor d’água e o dióxido de carbono na atmosfera terrestre absorvem a maior parte das frequências no espectro infravermelho, um telescópio espacial é preferível para estas observações. Isso também exige um grande controle de sua temperatura, que deve ser mantida extremamente baixa.

Observar no espectro infravermelho é uma técnica chave para ver estrelas e galáxias mais velhas e em maior quantidade, devido ao desvio cosmológico para o vermelho e porque este tipo de radiação penetra melhor na poeira e no gás. Isto permite a observação de objetos mais obscuros e frios, o que inclui exoplanetas. A interação da radiação infravermelha com os constituintes atmosféricos premite conhecer a composição da atmosfera através da análise do espectro eletromagnético recebido pelo telescópio.

A luz de uma estrela é fornada por todo tipo de radiação: infravermelho, ultravioleta, micro-ondas, etc. Ao atingir o planeta, as substâncias químicas na sua atmosfera absorvem certos comprimentos de onda característicos (as chamadas assinaturas químicas) e deixam passar o resto. Um espectro de transmissão é feito comparando a luz estelar que é filtrada através da atmosfera de um planeta à medida que este se move na frente de sua estrela com a luz estelar não filtrada que é detectada quando o planeta está próximo à estrela. Os pesquisadores são capazes de detectar e medir a abundância de gases na atmosfera de um planeta a partir do padrão de absorção, ou seja, as localizações e alturas dos picos no gráfico.

Exoplanetas

Os primeiros exoplanetas foram descobertos no início dos anos 1990 e, por serem extremamente pequenos (se comparados ao tamanho de suas estrelas) e distantes de nós, nunca vimos a maioria deles: só sabemos de sua existência com base no efeito que têm em suas estrelas hospedeiras. O exoplaneta WASP-96b é um entre os mais de 5 mil que conhecemos na Via Láctea, e está localizado a 1.150 anos-luz de nós. É um tipo de gigante gasoso menos denso daqueles no nosso sistema solar: seu tamanho é 1,2 vezes o de Júpiter, mas sua massa é cerca da metade. Sua temperatura média é próxima dos 500°C por estar muito perto da sua estrela (chamada WASP-96) – sua órbita é tão pequena que um ano completo lá tem cerca de 3,5 dias terráqueos.

Em 21 de junho de 2022, o instrumento gerador de imagens Near-Infrared Imager and Slitless Spectrograph (NIRISS) mediu a luz do sistema WASP-96 por 6,4 horas enquanto o planeta passava na frente da estrela. O resultado é uma curva de luz mostrando o escurecimento geral da luz das estrelas durante sua trajetória e um espectro de transmissão revelando a mudança no brilho de comprimentos de onda individuais da luz infravermelha entre 0,6 e 2,8 mícrons. Conforme registrado oficialmente pela própria NASA, o sinal inconfundível de água foi capturado, juntamente com evidências de nuvens e neblina, na atmosfera ao redor de WASP-96b.

Espectro de transmissão obtido a partir da análise do WASP-96b e os picos que indicam a presença de água em sua atmosfera. Fonte: NASA
Espectro de transmissão obtido a partir da análise do WASP-96b e os picos que indicam a presença de água em sua atmosfera. Fonte: NASA

A linha azul no gráfico é um modelo de melhor ajuste que leva em consideração os dados, propriedades conhecidas de WASP-96 b e de sua estrela (por exemplo, tamanho, massa e temperatura), e as características presumidas da atmosfera. Os pesquisadores poderão usar o espectro para medir a quantidade de vapor de água na atmosfera, limitar a abundância de vários elementos, como carbono e oxigênio, e estimar a temperatura da atmosfera em profundidade. Eles podem então usar essas informações para fazer inferências sobre a composição geral do planeta, além de como, quando e onde ele se formou.

O exoplaneta WASP-39b é classificado como um Júpiter quente (devido a sua semelhança com esse planeta do nosso sistema solar, apesar de um período orbital bem menor) que orbita uma estrela semelhante ao Sol, a 700 anos-luz da Terra. Embora tenha aproximadamente a mesma massa de Saturno, é menos denso e cerca de 50% maior, provavelmente devido ao aquecimento por estar tão próximo de sua estrela hospedeira – 20 vezes mais próximo de sua estrela do que a Terra está do Sol.

Espectro de transmissão obtido a partir da análise do WASP-39b e o pico que indica a presença de gás carbônico em sua atmosfera. Fonte: NASA
Espectro de transmissão obtido a partir da análise do WASP-39b e o pico que indica a presença de gás carbônico em sua atmosfera. Fonte: NASA

Descoberto em 2011, seus dados combinados dos telescópios Hubble, Spitzer e terrestres mostram a atmosfera mais detalhada já observada de um exoplaneta. Os resultados incluem informações sobre as nuvens do WASP-39b, a primeira detecção direta de fotoquímica na atmosfera de um exoplaneta e um inventário quase completo do conteúdo químico da atmosfera que revela pistas tentadoras da história de formação do exoplaneta.

Pela primeira vez, os astrônomos encontraram evidências inequívocas de dióxido de carbono na atmosfera de um exoplaneta em artigo publicado na revista Nature em 25 de agosto de 2022. Novos estudos publicados preliminarmente em 18 de novembro do mesmo ano também detectaram vapor de água, sódio, monóxido de carbono e dióxido de enxofre – produzido quando o sulfeto de hidrogênio é decomposto pela luz em suas partes constituintes e o enxofre resultante é oxidado. Em particular, a proporção de carbono para oxigênio sugere que o exoplaneta se formou muito mais longe de sua estrela hospedeira do que sua atual posição próxima. Os dados de modelagem e observação sugerem que o céu do exoplaneta é preenchido por nuvens fragmentadas – não de água, mas de silicatos e sulfitos.

WASP-39b provavelmente não é habitável para a vida como a conhecemos por, por exemplo, sua temperatura escaldante e composição gasosa. No entanto, a detecção da fotoquímica descrita tem implicações para estudos atmosféricos deste e de outros planetas.

Fontes

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