Nesse último domingo, 9 de outubro de 2022, o pneu do trem de pouso traseiro de uma aeronave de pequeno porte estourou durante o pouso no aeroporto de Congonhas (SP). O avião ficou rente ao barranco no final da pista, que foi interditada às 13h30 e gerou uma cascata de voos adiados e cancelados. A aeronave Learjet 75 transportava dois tripulantes e três passageiros e estava com a documentação regular.
Apesar da forma que a mídia vem noticiando, o que aconteceu não se trata de um acidente aéreo, e sim de um incidente. Existe uma diferença importante entre as duas definições e que tira um pouco o tom alarmista (mas não menos importante) do que aconteceu. É que um Incidente Aeronáutico é toda ocorrência associada à operação de uma aeronave que não chegue a se caracterizar como um acidente, onde não haja feridos graves, mortos, ou danos graves à aeronave, que impossibilite sua recuperação. De acordo com a Infraero, ninguém ficou ferido.
Investigadores do Quarto Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SERIPA IV), órgão regional do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), foram acionados para fazer a investigação do acidente envolvendo o avião matrícula PP-MIX. Inicialmente, são levantadas informações necessárias ao processo de investigação, que vão durar pelo menos alguns meses para a elaboração do relatório final. Conhecer as causas é importante para evitar novos acidentes ou incidentes.
Apesar da investigação ser um processo longo, é comum que envolvidos e especialistas especulem sobre as causas de um acidente aéreo. Um áudio que circula em grupos de pilotos indica que o pneu estourou no momento do pouso porque houve uma tesoura de vento e falha no freio. Você pode ver um vídeo do momento do pouso e do incidente abaixo:
Basicamente, uma tesoura de vento é a mudança brusca de direção e velocidade do vento em uma curta distância, resultando em efeitos cortantes ou descendentes. A origem desse fenômeno está no cisalhamento vertical do vento, quando ocorre mudança de ventos com a altura e geração de vorticidade horizontal. Ela é fundamental para organizar a formação de tempestades, separando as correntes ascendentes das descendentes.
No dia do incidente, a atmosfera estava realmente instável e tempestuosa a tarde. A chegada de uma massa de ar frio do Sul encontrou um ambiente com temperaturas por volta de 30°C sobre a região metropolitana de São Paulo. A massa de ar frio ocupa o lugar do ar quente, sendo mais uma forçante para que o ar suba e alimente nuvens de tempestade. Além disso, ventos em altitude de noroeste traziam umidade desde a Amazônia até o estado de São Paulo, alimentando e deslocando tempestades do interior para a capital. Várias cidades registraram pancadas de chuva e ventos fortes, intimamente relacionados ao cisalhamento do vento.
Durante uma tesoura de vento, o movimento do ar força a aeronave para direções indesejáveis durante o voo e muda a intensidade da sustentação ao longo da aeronave de maneira desigual. Tudo isso acontece em um período de tempo curto, com intensidade e de forma instável, deixando a pilotagem muito mais difícil. Veja mais sobre os Efeitos do vento sobre a aeronave no post do link.
O fenômeno ganha importância durante pousos e decolagens, que são as fases mais sensíveis do voo e quando ocorrem a maioria dos acidentes. Note na imagem o pouso de um avião durante a ocorrência de uma tesoura de vento. Um dos lados do avião desce mais do que o outro, fazendo com que um dos trens de pouso traseiros toque o solo antes que o outro. Isso causa uma pressão extra nesses pneus que, se ultrapassar a resistência dos pneus, pode estourá-los.
Fontes
- AviationCult – Incidente Aeronáutico X Acidente Aeronáutico: você sabe as diferenças?
- g1 – Cenipa inicia investigação sobre acidente que causou estouro de pneu de avião no Aeroporto de Congonhas
- Ribeiro, P. A. S. M. ([s.d.]). Influência do cisalhamento vertical do vento na estrutura das tempestades elétricas na América do Sul. Universidade de Sao Paulo, Agencia USP de Gestao da Informacao Academica (AGUIA). https://doi.org/10.11606/d.14.2022.tde-20052022-164530