Identificação de nuvens por diagramas termodinâmicos

De acordo com o Atlas Internacional de Nuvens da OMM, a classificação de nuvens é feita visualmente. Cada uma das formas que caracterizam a aparência de uma nuvem são descritas por: dimensões, forma, estrutura, textura, luminância (refletida, espalhada e transmitida) e cor (conforme a luz incidente). Ainda sobre a luminância, ela também pode ser modificada por fenômenos ópticos como halos, arco-íris, coroas, glórias, etc.

O Atlas também descreve uma distribuição vertical das nuvens, como altura do nível da base, do topo e extensão vertical – veja mais no post Atlas de Nuvens. Uma forma de estimar essas grandezas, assim como o tipo de nuvem, é através de dados de perfil vertical (como os obtidos através de radiossondagens) sobre um diagrama termodinâmico, como o “skew T x log P”.

De modo geral, a formação/intensificação da nebulosidade esta relacionada à umidade e à instabilidade atmosférica, sendo que a advecção de temperatura, movimentos verticais e processos diabáticos são fatores que podem modificar a instabilidade.

A umidade auxilia na identificação e determinação da espessura das camadas da troposfera que muito provavelmente contém algum tipo de nuvem. Quanto maior a umidade, mais próximas estão as linhas de temperatura do ar (Ta) e temperatura do ponto de orvalho (Td). Os ambientes mais propícios apresentam diferença entre Ta e Td menor ou igual 3°C (níveis baixos e médios) ou 5°C (altos níveis). O vapor d’água pode vir da própria superfície (movimentos verticais, convecção, ciclones) ou transportado de locais muito úmidos (como florestas densas e oceanos) costuma ocorrer especialmente em baixos níveis. Isso aparece no diagrama termodinâmico como um movimento da esquerda para a direita dos valores de Td no tempo. O ar mais seco em níveis mais altos pode fluir verticalmente para baixo (subsidência, resfriamento noturno), vindo mais seco e aumentando a temperatura, causando uma inversão de subsidência.

Com relação à instabilidade, quando existe inversão térmica, isotermia ou estabilidade, é muito mais provável o desenvolvimento horizontal de nuvens (estratiformes). Já quando existe instabilidade absoluto e/ou condicional, é mais provável a formação de nuvens de desenvolvimento vertical. Uma camada estável pode se formar se ocorrer um resfriamento da massa de ar próximo da superfície (frentes frias, por exemplo) ou pela advecção de ar quente em níveis mais altos, enquanto que uma camada instável se forma quando o aquecimento ocorre a junto da superfície ou pelo resfriamento de uma camada superior (por advecção, por exemplo). A advecção de ar quente em médios e baixos níveis (nessa sequência) é observada durante a passagem de frentes quentes.

Para nuvens cumuliformes, a instabilidade tem maior importância do que a umidade, já que a área de CAPE+ costuma ser grande, mas podem se formar devido à presença de ar úmido ou instabilidade absoluta em baixos níveis, ou mesmo acima de uma camada seca e estável caso haja uma camada de instabilidade absoluta logo acima. Já para nuvens estratiformes, a umidade é mais importante, já que para sua formação a estabilidade (ou instabilidade condicional muito fraca) atua como uma camada de retenção de umidade.

São consideradas nuvens de desenvolvimento horizontal todos os tipos de nuvens altas e médias, assim como stratocumulus e stratus. A seguir, algumas características de perfis verticais típicos para formação e desenvolvimento de cada tipo de nuvem – para uma descrição morfológica de cada uma, consulte os respectivos links no post Atlas de Nuvens. Por serem descrições bastante genéricas e com dados baseados em latitudes médias, podem aparecer diferentes tipos de nuvens em diferentes camadas e com diferentes quantidades de umidade e de instabilidade na natureza.

Stratus (St)

Geralmente se forma em atmosfera estável, abaixo de uma inversão térmica ou isotermia. Sua base pode se formar junto da superfície, classificando-a como nevoeiro (visibilidade menor que 1000 metros) ou névoa úmida (caso contrário). Isso ocorre quando a camada superficial está sem turbulência (vento calmo ou ausente), permitindo o acúmulo de umidade em baixos níveis. A camada de retenção acima pode ser seca ou úmida (formando nuvens St também), e se persistir, pode gerar chuvisco. Com o aumento da temperatura (e redução da umidade), pode subir e formar stratocumulus.

Perfil vertical com provável formação de nuvem stratus da superfície até 900 hPa, abaixo da inversão térmica entre 900 e 850 hPa. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).
Perfil vertical com provável formação de nuvem stratus da superfície até 900 hPa, abaixo da inversão térmica entre 900 e 850 hPa. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).

Stratocumulus (Sc)

Apesar de se formar sob condições relativamente estáveis (abaixo de inversão térmica ou isotermia), um pouco de instabilidade pode ser observada abaixo de sua base e uma pequena área de CAPE+ pode se formar entre a camada instável e a região de inversão/isotermia. Dentre as situações que podem levar à formação estão a estratificação de cumulus e da parte baixa das cumulonimbus (término da instabilidade).

Sobre mudanças das Sc para outros tipos de nuvens. Quando existe uma stratocumulus e a umidade aumenta continuamente enquanto a camada de inversão persiste, essa Sc entra em transição para uma stratus. Caso a instabilidade aumente e a inversão perca a força com a umidade ainda elevada, pode-se formar torres de cumulus em regiões de Sc. Já se essa camada de inversão se deslocar para níveis médios e a umidade manter-se elevada em toda a extensão vertical, podem se formar nuvens nimbostratus a partir das Sc. As stratocumulus ainda podem gerar precipitação (chuvisco e chuva fraca) devido à contínua retenção de umidade provocada pela camada de inversão.

De modo geral, seu ciclo de vida começa durante a madrugada (aumento de umidade), aumentando a altura de sua base durante a manhã (aumento de Ta, secando o ar) e dissipando ao meio dia, devido à perda de força da inversão e gerando St fractus, ou dissipando a tarde, caso a inversão ainda persista e gerando uma névoa seca abaixo dela devido à evaporação da nuvem.

Perfil vertical com provável formação de nuvem stratocumulus formada em camada de alta umidade abaixo de inversão térmica entre 850 e 810 hPa, com camada de instabilidade logo acima. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).
Perfil vertical com provável formação de nuvem stratocumulus formada em camada de alta umidade abaixo de inversão térmica entre 850 e 810 hPa, com camada de instabilidade logo acima. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).

Altocumulus (Ac) e Altostratus (As)

A região úmida de ambas as nuvens aparece em níveis médios, sendo que as inversões térmicas não são necessariamente obrigatórias. A principal diferença está na quantidade de instabilidade: Ac se formam com uma área de CAPE+, o contrário das As.

Perfis verticais com provável formação de nuvens Ac (esquerda) e As (direita). Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).
Perfis verticais com provável formação de nuvens Ac (esquerda) e As (direita). Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).

Cirrus (Ci), Cirrocumulus (Cc) e Cirrostratus (Cs)

A região úmida dessas nuvens aparece em níveis altos. Se a instabilidade estiver alta na camada (área de CAPE+ relativamente elevada), nuvens Cc podem se desenvolver. Pouca instabilidade na camada e/ou inversão térmica ou isotermia acima da camada indicam presença de Cs e/ou Ci.

Perfil vertical com provável formação de nuvem cirrus. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).
Perfil vertical com provável formação de nuvem cirrus. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).

Nimbostratus (Ns)

Formam-se em níveis médios e baixos, mas podem alcançar altos níveis, e não apresentam instabilidade considerável. Uma situação típica de sua formação ocorre com inversão térmica ou isotermia em baixos níveis, com umidade na camada de inversão e acima. Quando da passagem de uma frente quente, é comum não haver área de CAPE+. Já em regiões tropicais, com mais instabilidade absoluta e/ou condicional, pode ocorrer alguma área com CAPE+.

Com o aumento da instabilidade, algumas torres de cumulonimbus pode surgir embebidas na Ns. Quando a instabilidade cessa em uma Cb, ele pode se tornar uma Ns. As e Ac também podem aumentar de espessuar até virar uma Ns. Caso exista uma camada seca no meio, ela pode estar dividindo uma Ns de uma As.

Perfis verticais com provável formação de nuvem nimbostratus: (esquerda) sem CAPE+ e com camada de inversão em baixos níveis; (direita) o contrário. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).
Perfis verticais com provável formação de nuvem nimbostratus: (esquerda) sem CAPE+ e com camada de inversão em baixos níveis; (direita) o contrário. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).

Cumulus (Cu)

Forma-se em condições instáveis (pelo menos em baixos níveis), mas pode ser observada uma camada de inversão/isotermia pouco intensa com relação às áreas mais instáveis (abaixo ou acima da inversão). Nuvens cumulus humilis se formam quando a camada de umidade é muito rasa, em baixos níveis e com ar seco acima e abaixo dela. Ao se desenvolvem verticalmente, atingem a classificação de cumulus mediocris quando a camada de inversão sobe. Conforme a inversão/isotermia aumenta, os topos dos cumulus mediocris são rasgados e passam a ser classificados como Sc.

Já uma cumulus congestus apresenta uma área de CAPE+ bem maior do que das outras espécies de cumulus. Sua base é identificada pelo NCC (Nível de Condensação Convectiva) e o topo é marcado pelo NCE (Nível de Convecção Espontânea), quando existe a perda de empuxo da parcela de ar que ascende no desenvolvimento da nuvem, um pouco abaixo de uma camada de inversão. Algumas nuvens podem ter o topo abaixo do NCE com seu topo rasgado e gerando também algumas Ac de base baixa ou Sc de base alta. Isso não deve ocorrer se a instabilidade absoluta próximo à superfície for grande o suficiente para compensar o ar seco em níveis mais elevados ao gerar fortes movimentos ascendentes.

As cumulus congestus podem gerar pancadas fracas a moderadas quando a umidade estiver elevada, mesmo que a instabilidade não esteja muito alta. Se não existir uma camada de inversão/isotermia no topo das nuvens, é muito provável que evoluam para Cb.

Perfis verticais com provável formação de nuvens cumulus humilis (esquerda) e cumulus congestus. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).
Perfis verticais com provável formação de nuvens cumulus humilis (esquerda) e cumulus congestus. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).

Cumulonimbus (Cb)

Assim como as outras nuvens cumuliformes, depende mais da instabilidade do que da umidade – ou seja, áreas de CAPE+ bem significativas. Quanto mais camadas secas estiverem contidas no perficl vertical, maior a chance de estarem eletricamente ativas e com condições para gerar queda de granizo. Caso contrário, é de se esperar chuvas abundantes mas com pouca atividade elétrica.

Perfil vertical com provável formação de nuvem cumulonimbus: instabilidade absoluta entre 1000 e 800 hPa; NCC em 900 hPa; topo em 355 hPa; muita umidade em todo o perfil. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).
Perfil vertical com provável formação de nuvem cumulonimbus: instabilidade absoluta entre 1000 e 800 hPa; NCC em 900 hPa; topo em 355 hPa; muita umidade em todo o perfil. Fonte: Fedorova, Pontes da Silva e Levit (2017).

A análise da instabilidade e da umidade na formação e desenvolvimento da nebulosidade é muito importante para previsão de tempo, especialmente quando aplicada às áreas de aviação e energia solar. Um bom entendimento na identificação do tipo de nuvem encontrado permite um diagnóstico correto das condições atuais da troposfera. A comparação do perfil típico do gênero de nuvem presente com o perfil vertical simulado em um modelo meteorológico permite dar maior peso aos modelos mais próximos do observado, por exemplo.

Fontes

WMO, International Cloud Atlas (2017). Appearance of clouds. https://cloudatlas.wmo.int/en/appearance-of-clouds.html

Fedorova, N., Pontes Da Silva, B. F., Levit, V. (2017) Análise e previsão prática das nuvens pelo diagrama termodinâmico SKEW-T/LOG-P.

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