Raio atingindo carros

O que acontece quando um carro é atingido por um raio? Se estiver com um capacitor de fluxo e se movendo a 88 milhas por hora, deveria viajar no tempo 😛 mas não é isso o que acontece. No início de 2023, um veículo foi atingido por um raio durante deslocamento pelo interior de Goiás, mas chamou a atenção pelo estrago que foi feito. Existem outros registros de carros que passaram por essas condições e praticamente não sofreram danos. Afinal, é seguro ficar dentro de um carro durante uma tempestade?

Vidro quebrado e antena traseira por onde raio entrou (esquerda) e interior do veículo queimado. Fonte: Nego Bill
idro quebrado e antena traseira por onde raio entrou (esquerda) e interior do veículo queimado. Fonte: Nego Bill (vídeo no link)

O vídeo de uma picape Ford Ranger com a cabine parcialmente derretida viralizou nas redes sociais após ter sido atingida por um raio em 20 de janeiro de 2023 na BR-020, entre as cidades de Simolândia e Posseno (Goiás). Segundo o mecânico Josimar, conhecido como “Nego Bill”, e autor da gravação, o raio atingiu a antena da Ranger, que estava coberta por seguro e teve perda total. Em entrevista ao UOL, ele explicou a situação, deixando claro que o motorista não sofreu nenhum choque ou ferimento:

“Nesse dia, estava chovendo bastante, com muitos raios. O meu cliente estava vindo em uma fila com outros seis carros, quando viu um clarão e escutou um barulho. A caminhonete acendeu todas as luzes do painel e deu uma pane geral (…) Ele saiu rapidamente e fechou as portas para o fogo não se alastrar. Felizmente, não teve nenhum ferimento. Como há isolamento do veículo, ele nem sequer levou algum tipo de descarga elétrica (…) A gente cortou os cabos de bateria para não gerar outro incêndio. O fogo estourou o para-brisa e derreteu o painel.”

Uma crença geral diz que os pneus, feitos de material que é isolante elétrico, conseguem proteger dos raios. A borracha realmente pode isolar o fluxo elétrico, mas para valores de tensão e de corrente bem mais baixos se comparados aos que acontecem durante um raio. Um raio pode ter de 100 milhões a 1 bilhão de Volts e corrente de 30 mil a 300 mil Ampères. O carro ainda é um lugar dos mais seguros para se estar abrigado durante uma tempestade elétrica, mas a explicação de como essa proteção ocorre é bem diferente.

A carroceria do carro é feita de um material condutor elétrico, o que é um caminho que enfreta bem menos resistência (e menor gasto de energia) para que a eletricidade do raio flua até o solo. Note que a descarga elétrica inclusive atravessa os pneus. Com as cargas elétricas fluindo somente pela carroceria, o interior do veículo fica blindado de interferências eletromagnéticas externas. Esse fenômeno é conhecido como Gaiola de Faraday, em homenagem ao cientista britânico Michael Faraday (1791-1867).

Embora cada queda de raio seja diferente, danos à antena, ao sistema elétrico, ao para-brisa traseiro e aos pneus são comuns. O calor de um raio é suficiente para derreter parcialmente a antena de um veículo e pode causar o que parece ser uma pequena explosão de faíscas quando pequenos fragmentos de metal derretem e queimam. Uma parte da descarga pode atingir o sistema elétrico do veículo e danificar ou destruir os componentes eletrônicos. O raio também pode atingir os pequenos fios de desembaçamento que estão embutidos nas janelas traseiras, causando a quebra das janelas. Também é muito comum que o raio destrua um ou mais pneus ao passar pelas cintas de aço até o solo.

E o que causou o incêndio no carro? Quando uma corrente elétrica passa em um meio, este é aquecido devido à colisão entre as cargas e o material constituinte. Isso é conhecido como efeito Joule. Com uma corrente tão alta, o material pode aquecer a temperaturas suficientemente altas para que entre em combustão. Fora a carroceria de aço, a picape tem materiais isolantes e que não conduzem bem a eletricidade, como o plástico do painel e a forração interna. Esses que acabam aquecendo mais e pegando fogo.

Como o ocupante do carro fechou a porta, o oxigênio no interior foi consumido pelo fogo, o que contribuiu para que o incêndio acabasse mais rapidamente. Para completar, os cabos da bateria foram cortados para não gerar outro incêndio.

RESUMO DO OCORRIDO: partindo do relato, o raio caiu na antena do rádio e assim atingiu o sistema elétrico. Mesmo com a eletricidade fluindo para o solo devido ao fenômeno da Gaiola de Faraday, a forte corrente elétrica fluindo gerou aquecimento até o ponto de componentes internos do carro pegarem fogo. O motorista não foi atingido pela corrente e saiu rapidamente do carro, não sendo atingido pelas chamas também.

No entanto, vários outros carros já foram atingidos e sem incêndios. Muitas vezes as pessoas nem percebem que o carro em que estavam foi atingido, só sentem um forte trovão junto do clarão do raio. Alguns relatos foram noticiados ao redor do mundo e podem ser encontrados facilmente através de algum mecanismo de busca na web, veja alguns deles:

E por que o raio atingiu justamente a antena do carro? Os lugares mais prováveis de cair um raio são onde ocorre um grande acúmulo de cargas elétricas, o que acontece em pontas. Nessa condição, o campo elétrico e a densidade de carga induzidas tornam-se bastante elevados. Esse fenômeno é conhecido como o poder das pontas – veja mais no post sobre Raios e trovões!

Próximo à ponta, o campo elétrico pode ultrapassar o valor da rigidez dielétrica do ar, tornando-se um condutor. Assim, se o ar, que não é um bom condutor de eletricidade, acaba se tronando por causa do grande campo elétrico, até a borracha do pneu também poderia conduzir eletricidade do raio (ainda mais pela superfície molhada). A energia elétrica de um raio é muitas vezes maior do que a borracha dos pneus pode aguentar.

Fontes

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2 comments

    1. De acordo com essa pesquisa (https://agencia.fapesp.br/raios-e-mudancas-climaticas/11766), estima-se que cada grau a mais registrado na temperatura global pode ocasionar um aumento de 10% a 20% na incidência de raios. Como a temperatura média do planeta já vem aumentando, a chance de ter mais tempestades severas também é maior. E com o aumento de áreas com ocupação humana, isso também ajuda aumentar a probabilidade de alguém ser atingido por um raio. O jeito é cada um se proteger individualmente. A Defesa Civil publicou um informe sobre prevenção contra raios, segue o link: https://www.defesacivil.pr.gov.br/Pagina/Prevencao-Raios

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