O ECMWF colocou em operação o sistema de previsão baseado em inteligência artificial (AIFS) em 25 de fevereiro de 2025, que funcionará em paralelo ao tradicional modelo físico (IFS) para aprimorar a previsão numérica do tempo. O AIFS supera modelos físicos avançados em diversos aspectos, como a previsão de trajetórias de ciclones tropicais, com ganhos de até 20%. Além disso, oferece previsões mais rápidas e reduz o consumo de energia em cerca de 1.000 vezes.
O AIFS é o primeiro modelo operacional aberto de previsão do tempo baseado em aprendizado de máquina (ML), cobrindo uma ampla gama de variáveis, como vento, temperatura e precipitação (chuva, neve etc.). Sua resolução atual é de 28 km. Esse modelo foi projetado para atender diversos setores, como energia renovável, auxiliando na previsão da radiação solar e da velocidade do vento para otimizar operações.
O AIFS e o IFS começam do mesmo ponto: ambos utilizam as mesmas condições iniciais, que combinam previsões de curto prazo com cerca de 60 milhões de observações coletadas globalmente de satélites, aviões, navios, boias oceânicas e estações terrestres. No entanto, a forma como cada um transforma essas informações em uma previsão do tempo é fundamentalmente diferente.
Modelos físicos
Os modelos físicos de previsão do tempo, como o IFS, funcionam resolvendo um conjunto de equações matemáticas que descrevem a dinâmica da atmosfera e os processos físicos envolvidos, como movimento do ar, condensação de vapor d’água e troca de energia entre a superfície e a atmosfera. Essas equações são baseadas em leis conhecidas da física, como as equações de Navier-Stokes para fluidos, equações da termodinâmica e interações radiativas.
Para calcular a previsão, o IFS divide a atmosfera em uma grade tridimensional e aplica essas equações em cada célula da grade ao longo do tempo. A resolução espacial do IFS é de 9 km, o que significa que cada célula representa uma área dessa dimensão. Esse método é altamente confiável, pois respeita os princípios físicos, mas exige enorme poder computacional e grande consumo de energia, pois cada atualização requer bilhões de operações matemáticas complexas. Além disso, algumas aproximações e parametrizações dependem da escala espacial e temporal para gerarem resultados factíveis.
Modelos baseados em IA
O AIFS, por outro lado, não resolve explicitamente as equações físicas. Em vez disso, ele é um modelo treinado para reconhecer padrões e aprender as relações entre as variáveis meteorológicas a partir de um grande volume de dados históricos. Esse treinamento envolve alimentar uma rede neural com anos de previsões e observações passadas, permitindo que o modelo “aprenda” como o tempo normalmente evolui dadas determinadas condições iniciais.
Uma vez treinado, o AIFS pode gerar previsões futuras de maneira extremamente rápida, apenas inferindo padrões aprendidos, sem precisar resolver equações físicas a cada passo. Esse método reduz drasticamente o tempo de processamento e o consumo de energia – cerca de 1.000 vezes menor do que o de um modelo físico tradicional.
No entanto, modelos baseados em IA apresentam desafios: eles podem ser menos interpretáveis, pois o processo de decisão da rede neural não segue explicitamente leis físicas conhecidas. Além disso, podem ter dificuldades em prever eventos raros ou extremos se não tiverem exemplos suficientes desses eventos no conjunto de treinamento.
Atualmente, a versão operacional do AIFS é chamada AIFS Single, que gera uma única previsão determinística para cada ciclo. No futuro, o ECMWF pretende expandir essa abordagem para um sistema de previsões em conjunto (ensemble forecasting), onde 50 previsões ligeiramente diferentes são geradas a partir das mesmas condições iniciais. Esse método ajuda a capturar a incerteza da previsão e a fornecer probabilidades para diferentes cenários, assim como já é feito com os modelos físicos há mais de 30 anos.
Característica | Modelos Físicos (IFS) | Modelos de IA (AIFS) |
---|---|---|
Base | Equações físicas | Dados históricos e padrões |
Processamento | Simulações numéricas intensivas | Inferência baseada em aprendizado prévio |
Velocidade | Lento, devido a cálculos complexos | Muito rápido depois de treinado, apenas faz previsões baseadas em padrões aprendidos |
Consumo de energia | Alto | Muito baixo (1.000 vezes menor) |
Precisão em eventos raros | Boa, pois segue leis físicas | Pode ser limitada se o evento for pouco representado nos dados |
Interpretação | Transparente, pois segue leis conhecidas | Opaca (efeito “caixa preta”) |
Atualização | Requer novas simulações com supercomputadores | Pode ser refinado treinando com mais dados |
Apesar do código não ser aberto, os pesos gerados pelo treinamento e que permitem gerar novas previsões são abertos. Se tiver uma GPU (Graphics Processing Unit) a sua disposição, pode rodar o modelo você mesmo. Para isso veja mais informações nesses links do Hugging Face: AIFS Single – v1.0 e jupyter notebook.
O ECMWF planeja disponibilizar previsões em conjunto e testar previsões sub-sazonais baseadas em dados. Também estudará a possibilidade de combinar previsões baseadas em IA e em física nos próximos anos. Mais informações sobre a implementação do modelo operacional AIFS estão disponíveis no link, e o modelo também foi apresentado em um webinar. Além disso, uma série de postagens do blog AIFS pode ser acessada no site.
O post Previsão de tempo com Inteligência Artificial também fala mais do tema, nesse caso com o modelo da Google DeepMind (GraphCast).
No Brasil a MeteoIA é pioneira em modelagem atmosférica e de impacto climático nos diversos setores da economia e sociedade. Ela possui seus exclusivos modelos MIA-Weather e MIA-Climate
Oi Pedro, obrigado pelos links e pelas informações do seu comentário. Abraço!