Ondas de ar luminosas no céu que tornam a noite surpreendentemente clara aparecem descritas desde Plínio, o Velho, passando por relatos de 1783, 1908 e 1916, até observações fotométricas e instrumentais do século XX; nessas descrições, em noites sem lua o ambiente ficava tão iluminado que era possível ler, ver objetos a centenas de metros e distinguir pequenos detalhes no solo, e observadores descreviam faixas ou “nuvens” luminosas que lembravam a luz do dia.

“O fenômeno comumente chamado ‘Sol Noturno’, isto é, uma luz que emana do céu durante a noite, foi visto durante o consulado de C. Caecilius e Cn. Papirius (≈ 113 a.C.) e em muitas outras ocasiões, dando aparência de dia durante a noite” (Plínio, o Velho)
“Às 20h, era muito fácil distinguir os objetos nas ruas sem iluminação artificial. É essa luminosidade geral que chamou minha atenção, devido à escassez de carvão, a escuridão era completa nas ruas desprovidas de eletricidade. Às 22h30 pude fazer observações mais completas. Céu muito claro, cheio de estrelas que brilhavam até o horizonte. Sem luar. Todos os detalhes da paisagem eram visíveis. No jardim, podíamos reconhecer todos os objetos sem qualquer dificuldade. Pedregulhos (diâmetro 10 mm a 15 mm) brilhavam sobre o chão escuro.” (M. Toucher, 1908)
“Quando o sol está mais de 18 graus abaixo do horizonte, sem lua brilhando e sem fenômenos aurorais visíveis, acontece que o céu, estando limpo ou nublado, fica total ou parcialmente iluminado. A luminosidade, que geralmente aumenta em direção ao horizonte, atinge às vezes uma intensidade igual à luz difusa da meia-lua; letras impressas de tipo relativamente pequeno são facilmente distinguíveis; relógios podem ser lidos muito bem; pequenos objetos são certamente visíveis a distâncias relativamente grandes, por exemplo, postes telegráficos a 100 metros e mais.” (Yntema, 1909)
Esses relatos históricos e os registros modernos de “bright nights”, “noites brilhantes” ou “sol noturno” correspondem a eventos em que o brilho natural da alta atmosfera — o airglow — torna-se intenso e organizado em estruturas bem definidas. Com o crescimento da iluminação artificial noturna em todo o mundo, fica cada vez mais difícil visualizar o fenômeno a olho nu. Em alguns casos observacionais modernos, medidas fotométricas e instrumentais registraram aumentos de emissão em linhas específicas, como a linha verde do oxigênio O(1S) em ~557,7 nm, com intensidades que atendem aos critérios usados para classificar uma noite como brilhante.
O airglow, ou luminescência atmosférica, é a emissão de luz produzida pela própria alta atmosfera por processos químicos e de recombinação que ocorrem após a excitação por radiação solar durante o dia ou por reações químicas contínuas à noite; não se trata de reflexão de luz externa nem de nuvens troposféricas “acendendo”, mas de átomos e moléculas em camadas em torno de 80–300 km que, ao decaírem de estados excitados, liberam fótons em comprimentos de onda característicos. As emissões mais visíveis para observadores a olho nu e para câmeras terrestres incluem a banda verde do oxigênio atômico em ~90–100 km e bandas de OH e Na em faixas próximas; a intensidade local do airglow depende da abundância das espécies emissoras, das taxas de reação, da temperatura e de processos de perda de energia por colisão (quenching). Aurora e airglow podem até produzir padrões ondulados, mas são fenômenos distintos: a aurora resulta da precipitação de partículas carregadas energéticas guiadas pelo campo magnético e produz emissões fortemente associadas à atividade geomagnética e a bandas espectrais características, enquanto o airglow é uma emissão química e fotoquímica generalizada da atmosfera superior, ocorrendo mesmo sem atividade magnética.
Influência das ondas de gravidade
As chamadas ondas de gravidade atmosféricas são eventos dinâmicos gerados quando uma perturbação na troposfera — por exemplo, uma forte tempestade, um sistema de montanhas ou frentes atmosféricas — empurra e puxa camadas de ar estáveis, provocando oscilações que se propagam horizontal e verticalmente através da atmosfera. Note que isso não têm relação com as ondas gravitacionais, que são distorções no espaço-tempo geradas por eventos cósmicos, como a fusão de buracos negros.
Essas ondas atmosféricas transportam energia e momento e, ao alcançarem as camadas emissores do airglow, induzem variações locais de densidade, temperatura e composição química. Em termos físicos, cristas de onda comprimem o ar e podem concentrar as espécies emissoras e aumentar as taxas de emissão, enquanto vales rarefazem o ar e reduzem essas taxas; mudanças de temperatura alteram constantes de reação e probabilidade de emissão versus quenching, e deslocamentos verticais transportam camadas ricas em determinados radicais ou átomos para altitudes onde a emissão é mais eficiente.
O resultado observado é uma modulação espacial e temporal do airglow que se manifesta como faixas, bandas ou estruturas onduladas. Muitas vezes são parecidas com “nuvens” luminosas no alto da atmosfera, mas essas estruturas não são nuvens troposféricas que refletem luz, e sim regiões do ar que estão emitindo mais ou menos luz em função da passagem da onda.
Portanto, quando relatos históricos falam de “noites brilhantes”, o quadro mais consistente com evidências modernas é o de um airglow intensificado e organizado por ondas de gravidade: a fonte da luz é a própria atmosfera superior, os padrões visíveis são a marca deixada pela modulação dessas emissões pelas ondas e a distinção em relação à aurora decorre tanto da origem física quanto das assinaturas espectrais e da relação com a atividade geomagnética. Estudos instrumentais e fotométricos do século XX confirmam aumentos significativos em linhas específicas durante eventos de noite brilhante, e imagens de amplo campo mostram claramente a estrutura ondulada que vincula diretamente as ondas de gravidade à aparência visual histórica do fenômeno.
Fontes
- Metsul – Fotógrafo faz raro registro no brasil de ondas de gravidade em tempestade
- Wikipedia – Airglow
- Observador – Fenómeno de Sol Noturno explicado por cientistas
- Shepherd, G. G., and Y.-M. Cho (2017),WINDII airglow observations of wavesuperposition and the possibleassociation with historical “brightnights”, Geophys. Res. Lett., 44,7036–7043, doi:10.1002/2017GL074014



