Física aplicada ao conforto ambiental – Exercícios

Aqui estão alguns exercícios resolvidos usando conceitos apresentados no post Física aplicada ao conforto ambiental.

1. Calcular a resistência térmica total Rt e a transmitância térmica U de uma parede composta por reboco externo de argamassa (2 cm), tijolo maciço de barro cozido (15 cm) e reboco interno de argamassa (1,5 cm). Utilize os valores de condutividade térmica (λ) conforme a NBR 15220-2. Considere também as resistências térmicas superficiais interna e externa fornecidas pela norma.

Resolução

CamadaEspessura (m)Condutividade térmica (W/m·K)
Reboco (argamassa)0,02 (ext)1,40
Tijolo maciço de barro0,150,81
Reboco (argamassa)0,015 (int)1,40

Resistências superficiais (conforme zona bioclimática):

  • Interna Rsi = 0,13 m²·K/W
  • Externa Rse = 0,04 m²·K/W

A resistência térmica de uma camada homogênea é dada por R = λ/e, onde e é a espessura (m) e λ é a condutividade térmica (W/m·K).

  • Camada 1: Reboco externo R1 = 0,02/1,40 = 0,0143 m²·K/W
  • Camada 2: Tijolo maciço R2 = 0,15/0,81 = 0,1852 m²·K/W
  • Camada 3: Reboco interno R3 = 0,015/1,40 = 0,0107 m²·K/W

Cálculo da resistência térmica total e transmitância térmica:

Rt = Rse + R1 + R2 + R3 + Rsi = 0,3802 m²·K/W

U = 1/Rt = 1/0,38 ≈ 2,63 W/m²·K

Esse valor pode ser comparado com os limites de desempenho exigidos pela NBR 15220 para cada zona bioclimática do Brasil, a depender da finalidade da edificação (ex: mínima transmitância para conforto no verão ou inverno).

2. Considerando a mesma parede do exercício anterior, acrescente uma camada de isolante térmico (poliestireno expandido/EPS) de espessura de 2 cm e condutividade térmica de 0,036 W/m·K. Considere que a edificação está em São Carlos/SP, com área da parede exposta de 10 m², 35°C externamente e 25°C internamente.

a) Calcule a nova resistência térmica total e a nova transmitância térmica.

b) Calcule a carga térmica da parede exposta à radiação solar (sem e com isolamento).

c) Compare a variação da carga térmica e interprete o resultado.

Resolução

  • Resistência térmica Reps = 0,5556 m²·K/W
  • Nova resistência térmica total: Rt = 0,9358 m²·K/W
  • Nova transmitância térmica: U = 1,07 W/m²·K

Cálculo da carga térmica da parede em São Carlos/SP:

Q = U⋅A⋅ΔT

Q = 1,07⋅10⋅10 = 107 W

Cálculo da carga térmica da mesma parede sem isolamento:

Q = 2,63⋅10⋅10 = 263 W

Redução da carga térmica com o EPS:

(263 − 107)/263 ≈ 59,3%

A introdução de uma camada de 2 cm de EPS reduziu em quase 60% a carga térmica transmitida pela parede, com impacto direto no desempenho térmico da edificação e na redução do consumo de energia com ar-condicionado.

3. Em uma sala de escritório em São Carlos/SP, as condições ambientais são:

  • Temperatura do ar: 25 °C
  • Temperatura média radiante: 25 °C
  • Umidade relativa do ar: 50%
  • Velocidade do ar: 0,15 m/s
  • Atividade metabólica: 1,2 met (escritório leve)
  • Roupas: 0,7 clo (roupas leves de verão)

Considere 1 met ≈ 58 W/m² e 1 clo ≈ 0,155 m²·K/W. A relação entre PMV e PPD é:

\(
PPD = 100 – 95 \cdot e^{-0{,}03353 \cdot PMV^4 – 0{,}2179 \cdot PMV^2}
\)

a) Qual é o valor estimado de PMV (Predicted Mean Vote) e PPD (Predicted Percentage of Dissatisfied) para essas condições?

b) Essas condições atendem à zona de conforto da ASHRAE 55?

Resolução

Segundo a ASHRAE 55, para as condições do exercício, a tabela de PMV indica que o índice estará próximo de zero (ou muito levemente positivo, como +0,1). Portanto, PMV ≈ 0,0.

Para PMV = 0, PPD = 100 − 95⋅e^0 = 100 − 95 = 5%

Segundo a ASHRAE 55, o ambiente está em conforto térmico aceitável se −0,5 ≤ PMV ≤ +0,5 e se PPD ≤ 10%. Como PMV ≈ 0,0 e PPD = 5%, o ambiente atende aos critérios de conforto térmico segundo a ASHRAE 55.

4. Escreva uma dissertação com o tema “Desempenho térmico e conforto ambiental como direito do cidadão e dever do Estado”. Aborde a importância de projetar e manter espaços públicos que garantam conforto térmico aos usuários, respeitando as normas técnicas e promovendo eficiência energética, e como isso se relaciona com saúde, bem-estar e produtividade da população.

Resolução

Em um país de clima predominantemente tropical como o Brasil, o desempenho térmico das edificações públicas ultrapassa o campo técnico da arquitetura e engenharia e se estabelece como uma questão social, ambiental e de cidadania. Garantir o conforto térmico e ambiental em escolas, hospitais, repartições públicas e demais equipamentos urbanos é assegurar condições mínimas para o bem-estar, a saúde e a produtividade da população. Neste contexto, o Estado tem papel fundamental tanto na formulação de políticas públicas quanto na aplicação de normas técnicas que assegurem ambientes saudáveis, eficientes e adequados ao uso humano.

O conforto térmico é definido como a condição na qual o indivíduo sente satisfação em relação ao ambiente térmico em que se encontra. Tal percepção é influenciada por fatores como temperatura do ar, umidade, velocidade do vento, radiação térmica, além de aspectos pessoais como a vestimenta e o nível de atividade física. A norma ASHRAE 55 e a NBR 15220 da ABNT estabelecem parâmetros para garantir ambientes termicamente confortáveis em diferentes condições climáticas, seja por meios passivos — como ventilação e sombreamento — ou por meios ativos, como sistemas de climatização. Quando esses critérios são desconsiderados nos espaços públicos, os usuários são expostos a extremos térmicos que comprometem sua permanência, concentração e até mesmo sua saúde.

Além do desconforto direto, ambientes mal projetados ou mal mantidos têm impactos indiretos significativos. Em escolas, por exemplo, a má qualidade térmica pode prejudicar o aprendizado; em hospitais, pode afetar negativamente a recuperação de pacientes; em repartições públicas, contribui para a queda da produtividade dos servidores e da qualidade do atendimento ao cidadão. Estudos demonstram que ambientes com conforto térmico adequado aumentam a eficiência no trabalho, reduzem o absenteísmo e melhoram a qualidade de vida dos ocupantes.

A responsabilidade estatal vai além da execução de obras. Ela envolve o planejamento urbano e arquitetônico baseado em dados climáticos locais, a exigência de projetos que atendam às normas de desempenho, e o investimento na manutenção das edificações públicas. Isso inclui a valorização de estratégias bioclimáticas, como ventilação cruzada, iluminação natural e uso de materiais com bom desempenho térmico, bem como a adoção de tecnologias sustentáveis e eficientes energeticamente. Ao promover tais ações, o Estado não apenas reduz gastos com energia, como também contribui para a mitigação das mudanças climáticas.

Por fim, garantir o desempenho térmico e o conforto ambiental das edificações públicas é um ato de justiça social. O cidadão que utiliza um posto de saúde, uma escola ou um centro cultural deve ter assegurado um ambiente digno, seguro e confortável. Isso é parte integrante do direito à cidade e à qualidade de vida, e não um privilégio. Assim, o Estado deve assumir seu papel como promotor de políticas públicas que unam o rigor técnico, a responsabilidade ambiental e o compromisso com o bem-estar coletivo.

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